Sem dúvida, a resposta é sim! Mas se você não entende as razões para isso, características como adaptabilidade, previsibilidade e visão sistêmica se tornam diferenciais para o mercado de trabalho
Todos sabem ou podem imaginar que a chegada de um filho é um momento ímpar, normalmente muito desejado e feliz. Em igual intensidade, carrega consigo muitos medos, inseguranças e questionamentos. Desde o início da gestação, inúmeras mudanças começam a ocorrer, e não me refiro somente às físicas ou hormonais.
Toda questão emocional, psicológica e a atmosfera familiar, bem como a preparação para a futura ausência da mãe de primeira (ou mais) viagens no trabalho, são insumo para carga mental excedente, planejamento e organização de atividades já considerando os desdobramentos possíveis.
Tudo isso para garantir que a orquestra da vida dessa mulher continue tocando de forma harmônica, exercitando a visão sistêmica e a previsibilidade sobre o que há por vir. A nova dinâmica é incorporada, sem que demais demandas sejam minimizadas e com o passar dos meses. A mulher aprende na pele o conceito de adaptabilidade.
Paradoxo inevitável da maternidade
O “M.B.A.” (“mestre em amar bebê”) mais complexo e enriquecedor da vida inicia-se para valer quando o bebê vem ao mundo, e a mãe vai para casa de licença. Num curto espaço de tempo, a mulher singular que existia dá lugar a uma nova, agora mãe de um ou mais crianças, com responsabilidades infinitas e desafios diários. É uma rotina intensa e contrastante regada a muitos sentimentos e superação. Essa mulher se engaja, se desdobra e se doa – e a entrega é inacreditável.
Para tentar elucidar o paradoxo que a mãe vive, gosto de fazer analogia ao fenômeno da alotropia do elemento químico carbono que forma o diamante e grafita, utilizada no lápis de escrever, devido às ligações e rearranjos distintos.
O diamante é um material rígido e comumente cobiçado nas joias, enquanto a grafita é um material mole e mais sensível. Quando a mulher se torna mãe, instintivamente ela torna-se um diamante em fortaleza e valor para manter e defender sua criação; ao mesmo tempo torna-se grafita, sensível, vulnerável e fácil de quebrar devido às inseguranças e ao cansaço.
Habilidades para o mundo corporativo
A partir de então, algumas características passam a fazer parte e serem desenvolvidas na vida da mulher de forma orgânica e paralelizadas:
Gerenciamento efetivo de tempo, pois criança é sinônimo de rotina e esse também é um processo a ser estabelecido. A gestão de tempo e priorização do que realmente é necessário e indispensável permite a essa mãe usufruir os bons momentos da maternidade e não somente aos afazeres que a engolem.
Antifragilidade, pois tem a capacidade de adaptar-se a novas pressões, como os hormônios em ebulição e a exaustão física. A transformação pessoal é diária para superar os desafios com flexibilidade.
Compaixão e cultura ao erro, pois essa mulher vai errar, se cansar, estar com privação de sono e de repouso efetivo, sentir-se inadequada, incapaz e exausta. E no final do dia, terá a certeza de que o melhor está sendo feito e que o amanhã é sempre uma nova oportunidade de recomeçar.
Empatia e escuta ativa, essenciais para aprender a lidar com o novo membro da família e interpretar suas necessidades físicas e emocionais, a fim de garantir-lhe afago, alimento e proteção. Para mães de outras viagens, empatia para se colocar no lugar dos demais filhos, suprir-lhes os sentimentos e inseguranças, dividir atenção e fazer com que todos sintam-se igualmente amados, ainda que nenhuma palavra seja dita.
Trabalho em equipe e cooperação. Mesmo quando existe apoio do pai ou de algum familiar próximo (o que, infelizmente, não é uma realidade majoritária), a mulher se sente perdida e sobrecarregada, pois a maternidade real não é romântica, indolor e inata, principalmente nos primeiros meses; esse choque entre teoria e prática culmina em conflito, cobrança e culpa. Por isso, é indispensável, inegociável e transformador a mãe ter uma rede de apoio colaborativa, empática e fundamentada, para permitir que dores e angústias sejam compartilhadas sem julgamento, sentimentos sejam acolhidos e respostas sejam encontradas trazendo o conforto necessário.
Com o passar do tempo, o bebê requer cuidados, comunicação, estímulos e interações diferentes. Isso leva a mãe a desenvolver a capacidade de ser generalista, estudando todos os temas possíveis que envolvam bem-estar, educação e desenvolvimento físico e comportamental da criança. Segundo a escritora Nanda Perim em seu livro Educar sem pirar (2021) a inteligência parental requer equilíbrio entre os pilares de conhecimento, autoconhecimento e relacionamento, e esse é um processo diário e constante.
Um retorno inevitável
Quando chega o momento de retorno ao trabalho, essa mulher se sente fortalecida como mãe, porém fragilizada pela separação. Ela já tem uma rotina organizada para voltar à posição, enquanto encara outras atividades como a logística de leva e traz, o planejamento de ordenha para manter a amamentação ou a preparação para introdução de novos alimentos na dieta da criança.
Ela está pronta, disponível, energizada e carrega consigo uma bagagem com poder de transformação. O trabalho faz parte de quem ela é, e comprometimento, dedicação e entrega fazem parte do que ela se propõe, com base em seus valores e propósito.
Certamente a resposta para meu questionamento inicial não é positiva em unanimidade, seja por descrença, desconhecimento ou preconceito. Embora haja maior engajamento, inclusão e rede de apoio nas empresas para as mamães e consultorias que prestam serviços com o propósito de promover conscientização e transformação cultural, a verdade é que ainda temos muito espaço a conquistar. Logo, há muita oportunidade de gerar provocações que fomentem a causa nos ambientes em que convivemos.
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